Um oficial com o qual conversei outro dia argumentava sobre o porquê da polícia abordar na maioria jovens e negros. Dizia ele que o perfil do suspeito era o do pobre e do negro, porque ele se encaixa nesse padrão. Bastava ver, segundo o seu argumento, qual a composição da população carcerária. Um detalhe, o policial em questão é negro e oficial da mais alta patente da polícia militar, portanto deve saber do que está falando.
Fico pensando cá com os meus botões se a responsabilidade não é só da polícia, porque só ela é culpada pela situação? O problema da segurança é muito mais complexo do que isso. Quem joga milhares de pessoas para fora do centro das grandes cidades para a moradia precária e sem infraestrura, se não a própria estratificação da sociedade e a persistente condição de apartheid social.
Passam-se os anos, mudam-se governos e a situação não se altera num país que passou seus primeiros 300 anos praticamente abandonado e espoliado até próximo do Século IX, quando por força da invasão de Portugal por Napoleão, a família real portuguesa veio ao Brasil.
Fomos dos últimos países a abolir a escravatura. Finda a escravidão, os negros foram jogados à sua própria sorte, ao ponto de, alguns retornarem para os seus velhos senhores, como trabalhadores assalariados.
Se ainda hoje temos escravidão forçada, vivemos a triste realidade de uma sociedade das mais desiguais do planeta.
Mais de dez por cento da população brasileira vive em favelas, outros tantos em bairros desprovidos de qualquer melhoramento. Em São Paulo, a cidade economicamente mais desenvolvida do país há bairros com esgotos a céu aberto.
Alguns especialistas negam a relação violência com o crime, mas basta atentar para alguns números para saber que os bairros aonde a estrutura é precária são os mais perigosos. Em alguns deles, nem a polícia entra. São dominados pelo crime organizado que ocupa o vácuo deixado pelo Estado. Diante dessa situação, de que valem os muros altos, os automóveis blindados, a não ser para nos tornarmos ainda mais esquizofrênicos e distantes uns dos outros, fingindo que essa situação não nos diz respeito?
Há que se admirar o pobres desse país (nem me refiro mais a esses das estatísticas) ou da classe média emergente que mantém ainda famílias estruturadas, apesar de conviverem com a marginalidade. Ali, convivem as vítimas e os seus próprios algozes.
Os pobres desse país, segundo os dados oficiais, são aqueles que vivem (?) com renda de R$ 70 a R$140, os miseráveis aqueles com renda até R$70. Isso para efeito do benefício do Bolsa Família. Afinal, quem é a classe medida emergente tão cantada e decantada pelos oficialistas? Qual é a renda dessa classe média?
Segundo o governo federal, a classe média brasileira recebe renda per capita de R$ 240 a R$ 1.019, valor próximo do que seria o salário mínimo real e nessa faixa de renda está enquadrada a metade da população brasileira.
O valor do aluguel de um barraco na favela não sai por menos de R$ 500. A quem desejam enganar os economistas que fazem essa a classificação de uma família de classe média?
A política oficial é a da “proteção ao pobre” mas na verdade reforça a necessidade de manter o pobre na sociedade para manipulá-lo melhor por meio dos programas de compensações sociais.